domingo, 27 de novembro de 2011

Imaginação, Cinema e Contradições II

Luiz Rosemberg Filho, cineasta brasileiro cuja obra faz uma crítica ao que poderíamos chamar uma maneira infame de fazer Cinema. 
Nesta entrevista uma pequena mostra de seu pensamento político e estético. No final do bate-papo podemos conferir o curta-metragem TRABALHO, inventiva crítica ao DAS KAPITAL.

Luiz Rosemberg Filho - colagem


Leonardo Carmo – o senhor dirigiu a atriz Adriana Prieto (1950-974) no longa metragem Balada da Página 3, em 1968.  Seu cinema é tecido de atrizes imbatíveis: Katia Grumberg, Ana Maria Miranda, Analu Prestes, Adriana de Figueiredo. Que atriz o encanta hoje no cinema brasileiro?

Luiz Rosemberg Filho – Acho que antes tínhamos mais opções sólidas pois as boas atrizes vinham do Teatro. Não eram vedetinhas de novelas e sim verdadeiramente atrizes. Eu não consegui mais ver no nosso cinema frescura ou frescor criativo de uma Isabel Ribeiro, Glauce Rocha, Dina Sfat. As de hoje, parecem todas marombeiras da “ Malhação”. Atriz ou ator virou isso: marombeiros de monstruosidades midiáticas do capitalismo. Sistema econômico que não suporta o encantamento e a magia. Mas...amos acreditar numa novíssima geração como a talentosa Barbara Vida, Mariana Dias...

LC – Lutero Luiz em O Santo e a Vedete , como Doutor Chupadinho e Wilson Grey no Crônica de um Industrial e Wilson Grey como de La Cruz  - ambos, premonição de políticos identificados com os  dos Governos Luis Inácio e Dilma Roussef , mas, não só com estes – parecem levar ao extremo a grotesco das personagens de Terra em Transe. O senhor poderia falar do seu processo de direção; como ensaia os atores? Que instruções de interpretação foram dadas a Renato Coutinho, o empresário do Crônica?

LRF – Sempre achei a direção de atores quase um casamento entre almas arteiras. Cada ator tem o seu EU e é preciso desvendá-lo para melhor servir ao Personagem. E o que sustenta uma boa interpretação é um estado doce de encantamento, de procura, de verdade – nem sempre muito claro na dinâmica do entendimento. Ousaria dizer que o trabalho  de direção é uma espécie e gozo fantástico, mais muito subjetivo.Às vezes passa, às vezes não. É como a música para o compositor que pode ser um acontecimento definitivo como as músicas do Johan Sebastian Bach, ou ficar na “ Eguinha Pocotó”. E,  em não sendo de modo algum teórico como  o Eisensein ou o Brecht, diagnosticar um processo tão subjetivo que passa pelo saber, pela sensibilidade, pelo encantamento, pelo comprometimento e pelo medo nem sempre dá para explicar por palavras. Cada ator/atriz tem  múltiplos processos de abordagem. O Renato Coutinho por exemplo queria alimentar-se de silêncio e medos. Queria chegar no seu personagem pela dor da perda e da velhice eminente. Conversávamos muito,mas nem sempre pela sua personagem mas por múltiplos caminhos possíveis.  Já com a Analu Prestes, era uma festa permanente. Foi sempre uma atriz muito instintiva e ousada. Acho que se a A$suntina  fosse outra, teríamos um outro tipo de filme.  Ela me pareceu fundamental para o filme, que foi pensado em Paris para ela. Cheguei com o roteiro pronto e a convidei uma vez mais. Amei a sua ousadia. E a filmei anos depois para um documentário sobre seu trabalho em artes plásticas. A Analu pode ser tudo e é muito gente!


LC – omo o senhor avalia a crítica cinematográfica brasileira atual?  O que é fundamental para ser um crítico de cinema?

LRF – Fundamentalmente a-m-a-r muito o cinema, a literatura, a filosofia, a músia, o teatro, a vida propriamente dita. Atualmente eu leio muito pouco o único jornal que temos no Rio e eu não é bom. Antes tínhamos o Alex Viany, o Muniz, o Jaime Rdorigues, o Zé Lino, o Gustavo Dahl e até mesmo o Cacá Diegues que escreve melhor do que filme. E já o defendi em dois de seus filmes. Mas está longe de ser um grande cineasta. Hoje temos quem? O Marcelo Ikeda e o Carlinhos Guimarães de Mattos – quer raramente me chega ás mãos. Pena. Acho que São Paulo tem mais críticos. Mas, não sei, pois pouco leio o Estadão e a Folha.


LC – O senhor sente falta de publicações sobre cinema e sobre cinema brasileiro em particular. Me refiro a publicações que pensam o cinema que fazem pensar o cinema...

LFR – Eu sempre me preocupei muito com isso e até cheguei a organizar um livro com vários depoimentos do Godard, na época proibido pela sua versão do “ Maria”, mãe de Jesus. Estava proibido nos cinemas e liberado em livro. Bobajada da censura, que depois o liberou sem nenhum  corte. Mas os religiosos de plantão queriam mostrar a sua força política e caíram de pau no filme. Bobajada histérica! Mas me permito achar que sem um certo conhecimento teórico do cinema, o máximo que se chega, é no pífio cinema-televisivo-publicitário da Globo Filmes. Seria bom que os nossos editores gostassem um pouco mais do cinema, como instrumento político, psicanalítico e mesmo filosófico. Ora, por que nunca se editou um roteiro como  Os Fuzis, Matraga, Vidas Secas, Bang-Bang, Gregório de Mattos e tantos outros? Preguiça ou fascismo? Mas... quem sabe não melhorará no futuro?


LC – As suas colagens, que ilustram seus textos na coluna Cinema de Invenção -, no extinto site VIA POLÍTICA, tem o mesmo princípio da montagem cinematográfica. Poderia comentar qual o pensamento embutido nessas colagens?

LRF – Digamos que as colagens são uma apropriação e transformação de imagens muito comuns, quase idiotas. Trabalho sobre o lixo, querendo pensar tanto a história, como o cinema. Políticos, bundas, peitos e quinquilharias acabam virando análise de olhares mais atentos, como o  teu por exemplo. Por outro lado, faço-as como terapia, assim como penso e escrevia para o Via Política, que é um seguimento afetivo do velho Versus. Mas não escrevo como crítico, teórico ou historiador. Escrevo como amigo do Matico e velho cineasta que bota no papel algumas reflexões do politólogo e amigo de juventude Sindoval Aguiar.Ele foi um cineasta delicado que agora se diz ex-tudo. Mas é também um poeta exemplar.  Deveria ter feito política, mas também odeia todos os Partidos. Gosto de discutir e escrever com ele. Somos  diferentes quanto ao entendimento do no que foi transformado o cinema: para ele já acabou. Eu ainda insisto em ser chato! Não vejo mais tudo como via antes, mas ainda me emociona ver trabalhos inovadores como Anticristo, Serras da Desordem, o cinema de Agnes Vardas, Visconti, Straub, Pasolini, Kubrick, Resnis, Rivette e alguns Bertolucci. Sem falarmos em Glauber, Joaquim Pedro, Joel Yamagi, Sergio Santeiro... 


LC – Seus filme mais recentes – curta-metragens – estão disponíveis no Via Política. Em As Últimas Imagens de Tebas, pareceu-me que o senhor usa  cinema pra uma crítica do processo de fazer cinema. Um filme mostrando  ao cinema que ainda e possível fazer filmes.

LRF – Não disse, mas amo muito o cinema-histórico filosófico do mestre Roberto Rossellini. Quando foi para a TV, usou magistralmente o cinema e a TV, para pensar a história e o saber – sem abrir mão da poesia. Fez uma política nova e viva com o cinema e a TV. “ Tebas” foi um trabalho ousadíssimo que me encantou fazê-lo tal como está: mudo! Os textos são cicatrizes do saber trágico. Usei os recursos das Colagens para mostrar que o cinema ainda pode ser simples, criativo e original. Desagradou a todo mundo, mas amei fazê-lo tal como esta. Sei que o Ikeda gostou e o queridíssimo Mario Alves Coutinho também. É uma viagem livre associada a velha Tragédia Grega. Estranhamente vivido por mim que não sou ator. Valeu a pena a ousadia, pela poesia, pela complexidade, pelo exercício e pela potência,  pois foi um desafio proposto pelo querido Marcelo Ikeda para que eu fizesse um filme mudo.Claro, escolhi os dois “ Édipos” com a mais ampla liberdade. A colaboração afetiva do André Scucato foi da maior importância pois me deixou livre para voar em condições no momento depressiva, pois estava cego com problemas de catarata. Depois do “ Tebas” já fiz “ O Discurso das Imagens”, concluídas com a colaboração do Lupercio Bogea. Desertos”, com o talento Pedro Bento. E falta editar “ Trabalhos” e “Fragmentos”. Isso feito vou dar um tempo, pois preciso cuidar um pouco mais de mim.

                        

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