sexta-feira, 7 de março de 2014

Teatro Épico XXX

                              
o que se vê é o falso
Teatro Épico X

                            
o forte é mais poderoso sozinho

quinta-feira, 6 de março de 2014

Teatro Épico II

                            
Teatro Épico


                           

sábado, 1 de março de 2014

ensaio-texto
                                 

Meus braços estão sumindo
Minha barriga crescendo
Meu nariz diminuindo
Eu estou morrendo
 
Meus cabelos estão brancos
Minha  pele está manchada
Meus pés fazem pisam o nada
Meu coração no ritmo da queimada
 
Tenho pelos nos ouvidos
A memória anda errada
Se eu vivi uma vida
Essa vida  está sepultada
 
As células morrem a cada balada
Cortei os  pulsos nessa madrugada
 Dei por mim  como  um boi sem boiada
Da mulher amada nem o pó da estrada

o ar transformado em música

O cantor Nelson Ned no Estádio de Nezahualcoyotl,em 1988; o show reuniu 50 mil pessoas


O ar transformado em música
                                                                            Leonardo Carmo *


            A morte do cantor e compositor Nelson Ned causou para além da tristeza de seus fãs e admiradores, reflexões sobre a arte e o artista brasileiro, em particular no segmento musical.
Desdenhado pela elite da MPB – seja lá o que isso for -  Nelson Ned lotou estádios no exterior  como o Carnagie Hall ou no Estádio Nezahualcoyotl, no México, onde cantou para 50 mil pessoas.
Como a arte musical é regida pelos números – shows, premiações, vendagens, regravações, etc -, os números relacionados ao sucesso de Nelson Ned não são nada modestos e qualquer pesquisa sobre sua popularidade e sucesso provam isso sem dificuldade alguma.
           Moacir Franco, foi taxativo no velório do cantor: “ No Brasil é assim, se o artista está fora do circuito da MPB, não toca em lugar nenhum”. Essa frase talvez sirva de epígrafe ao livro “ A Verdadeira História da Música em Goiás”, organizado pelo cantor e compositor Nilo Alves,  no prelo, com lançamento programado para fins de junho.
Respeitando a distância óbvia da produção de Nelson Ned e da música produzida pela classe média em Goiânia, uma pergunta auto-referente e no livro discutida por todos os entrevistados, é a questão do frágil sucesso comercial dessa música goiana.
Ou diretamente: por que os goianos não fazem sucesso no Rio de Janeiro e em São Paulo, capitais consideradas – e com razão – referências culturais no País? Meu objetivo nesse texto é suscitar discussão e diálogo observadas as regras da boa educação. Minha hipótese é: os goianos produzem uma música que não reflete a coisa própria de Goiás, como é o caso exemplar do Chico Science e Nação Zumbi, com o movimento mangue beat. Ali temos elementos folclóricos do Recife somados a influências da música pop, produzindo um som original, sem cópia, sem artifícios, pulsante, questionador.
Não estou dizendo: os goianos não possuem criatividade ou originalidade. Estou afirmando a falta a de loucura e ambição no manuseio das referências musicais goianas, de origens medievais inclusive, como a congada, a folia e a catira. Não houve até o momento uma releitura crítica desses elementos, propondo uma musicalidade com traços distintos, diferenciados do que poderia ser definido ou chamado de goiano.
Essa produção mediana de Goiânia poderia ser mais audaciosa, libertando-se de  desse conceito de MPB baseado em Ivan Lins, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Milton Nascimento e Chico Buarque. O livro acima mencionado trata dessas influências no muito produzido em Goiás. Mas, permanecemos presos a essas referências de MPB ou tropicalista. Gado perdido no descampado. Eu destacaria a autonomia de Leo Jayme e Orlando Morais, este com uma discografia a se descobrir.
A resposta a essa influência de aparente bom-gosto deve ser o brega. No brega que encontramos os ídolos goianos que ombreiam com Nelson Ned. Odair José, Amado Batista, Lindomar Castilho, Ângelo Máximo e Os Filhos de Goiás, para ficarmos com alguns. A primeira tarefa intelectual seria a de escovar a contrapelo o conceito de brega. É no brega , isento dos preconceitos academicistas, que está a força goiana, uma força que pode ser comparada ao poema Oração do Milho, de Cora Coralina.
            Por exemplo, encontramos na produção de História Cultural, da UFG, teses sobre Torquato Neto, Tom Zé, Chico Buarque, mas nada ou quase nada sobre a alimentação dos boiadeiros ou o Leo Lynce. Cultura é renúncia , renúncia da ignorância.  Parece agora que há toda uma rapaziada como o Pedra Letícia que começa a entender isso. E, sem preocupações mercadológicas.
            Sobre preocupações mercadológicas, retorno ao Nelson Ned, refletindo sobre  o “ apartheid musical”, a partir dos anos 1970, quando a música dita cafona era o som das classes mais pobres e ignorada pela elite e por parte da imprensa: “ O artista popular da minha linha, da linha de um Agnaldo Timóteo, não tem que se preocupar com a imprensa. Quem tem de se preocupar com a imprensa é Djvan, Milton Nascimento, Caetano Veloso, Chico, porque eles vivem de imprensa. Nós, não. Nós somos cantores de AM, de rádio, somos homens do povo”. Ou, Odair José – citando de memória -: “ MPB é um fenômeno musical de Ipanema”. A frase dele, no original, mais elegante, crítica e verdadeira.
            A dificuldade ou má-vontade em reconhecer a autenticidade de um Nelson Ned ou Odair José tem sido vencida aos poucos. Esse preconceito elitista talvez venha do pensamento nanico do brasileiro, sempre a reboque de modas européias, olhando o País com os olhos voltados para fora do País. Pode ser que de maneira equivocada, a música goiana nos moldes discutidos aqui, tenha se dado de modo endocolonizado.
            Ídolo na América Latina, Nelson Ned cantou os tristes trópicos, tristeza abordada por intelectuais como Monteiro Lobato e Paulo Prado. O Brasil é  um gigante com pés de galinha,  disse o pintor Iberê Camargo. Tristeza que acompanhou Nelson Ned em toda a sua existência mas que não o impediu de afirmar: “ Quando canto, me transformo, consigo ver o ar  transformado em música. É uma sensação gloriosa”. Há relatos de guerrilheiros da Frelimo, nos anos 1970,  descansando das batalhas contra os “tugas” ouvindo Nelson Ned. E viva os espinhos do caroço do pequi!

* Leonardo Carmo é coveiro em Pilar de Goiás